Dentre os variados axiomas que compartilhamos, a água, sem dúvida, é considerada elemento capital e extremamente necessária ao sustento da humanidade.
Também é óbvio, tomando como base o processo histórico, que algumas sociedades necessitaram mais água do que outras, já que o recurso esteve sempre presente, fosse consumido pelas populações e/ou aproveitado na produção agrícola, pecuária, industrial, dentre outras aplicações.
No artigo que publicamos nessa coluna, ainda em abril, interrogamos se era possível ranquear quais os prejuízos causados pela falta de água em algumas partes do mundo, ou quais seriam as consequências frente a uma hipotética indisponibilidade dos recursos hídricos em grande parte do nosso planeta.
Um recente estudo realizado nos Estados Unidos nos motivou escrever outra vez sobre a água. Um tema não só interessante, mas instigante, já que o momento atual – nacional e global – de certa forma nos estimula observar mais de perto o problema hídrico.
A pesquisa foi elaborada por alguns acadêmicos da Universidade de Cornell, do Serviço Geológico dos EUA e da Universidade do Arizona. A metodologia do estudo consistiu na combinação de dados históricos sobre as secas com novos modelos climáticos, observando as alterações nos padrões de ocorrências de chuvas causadas pelo aquecimento global. Segundo os pesquisadores, as mudanças climáticas produzirão secas severas nas décadas posteriores, consideradas piores do que qualquer outro período de escassez já visto nos últimos dois milênios.
O alerta emitido aos Estados Unidos comporta uma previsão preocupante, que é a probabilidade de 20% a 50% da ocorrência de uma seca avassaladora, durando 35 anos ou mais. Ademais, não só os americanos receberam más notícias a partir da pesquisa, pois o fenômeno também pode incidir sobre os países latino-americanos e africanos, e nas regiões próximas ao mar Mediterrâneo.
Retrocedendo à antiguidade, ainda entre os séculos 9 e 15, o impetuoso império Khmer dominava a região Sudeste da Ásia, e passado o seu auge, veio a decadência do reino. Algumas hipóteses foram levantadas e além dos problemas políticos, questões ambientais também foram consideradas fatores da queda do império.
A tese mais provável é que tenha havido um colapso no sistema de abastecimento de recursos hídricos, quando o rio Siem Reap, que fornecia água para o povo Khmer, baixou à determinado nível que tornou inadequada a irrigação. Desprovido da água e em guerra contra seus inimigos, o reino Khmer ruiu, demonstrando que, tanto em períodos anteriores quanto no momento atual, a indisponibilidade dos recursos hídricos emoldura uma paisagem crítica e caótica.
Retomando o cenário atual brasileiro, ontem o Sistema Cantareira, que abastece nove milhões de pessoas na capital paulista e no interior do estado, operava com 7,2% de sua capacidade, mesmo após o bombeamento do volume morto. Ainda em meados desse mês de setembro, o nível do Rio Paraíba do Sul que serve outros 15 milhões de habitantes de São Paulo e do Rio de Janeiro, tinha pouco mais de 4,5 metros, considerado o menor da história, desde que passou a ser monitorado em 1922. Por sua vez, a represa de Paraibuna, a maior da bacia, tinha armazenado apenas 10% do seu volume.
Levando em conta que a irregularidade pluviométrica tem ocorrido mais frequentemente, aqui e acolá, e que a água é insumo utilizado em praticamente toda atividade produtiva agrícola, industrial e indispensável ao abastecimento humano e dessedação animal, nos leva a inferir que a sustentabilidade do planeta depende da gestão dos ativos hídricos e da reorganização do modus operandi tradicional.
Voltando ao estudo citado anteriormente, os pesquisadores complementaram que a situação pode piorar ainda mais se a resposta ao aquecimento global ou as mudanças climáticas não for revisada, pois em alguns anos chove muito e em outros chove pouco. Para evitar tal infortúnio, torna-se incondicional não só o desenvolvimento de estratégias de alívio à seca, mas também alterações do modo como a água é manejada.
Parafraseando o escritor Augusto Cury: “Ninguém é digno do oásis se não aprender a atravessar seus desertos”.
Por Ariovaldo Zani, vice-presidente executivo Sindirações
Gabriel Zani/FFLECH/USP colaborou na elaboração do artigo
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