O Brasil já é reconhecido internacionalmente como o grande fornecedor de alimentos desse século por conta da fartura da produção agropecuária, invejável extensão territorial, além de nação abençoada com 13% da água doce disponível no planeta.
A indiscutível essencialidade da água, necessária à manutenção da vida e perpetuação da sociedade, determina urgência no estabelecimento de uma governança racional para cumprimento dos compromissos de conservação desse elemento-chave à segurança alimentar.
O desafio contemporâneo da sociedade moderna é minimizar o consumo por unidade do Produto Interno Bruto, de maneira a maximizar a grandeza da produtividade da água. O manejo apropriado da água na agricultura implica em menor pegada ambiental da atividade pecuária e maior eficiência na produção das carnes, ovos e leite.
Influenciado por diversas variáveis – renda, hábitos de higiene, costumes e cardápio – o Brasileiro de classe média consome2000 metros cúbicosde água por ano e 75% dessa água está inserida ou é mobilizada na produção da sua alimentação. Os 25% restantes se devem a água embutida/necessária à manutenção doméstica e outros itens industrializados que servem o dia a dia. Em comparação, a demanda per capita do cidadão global alcança1400 metroscúbicos, enquanto a do consumidor americano beira os3000 m3e dos Chineses não ultrapassa os1100 m3.
É importante salientar que um quinto dessa pegada hídrica global recai fora dos limites territoriais por efeito do comércio internacional. A “água virtual” movimentada ilustra a externalização do consumo e o impacto significativo da poluição que os consumidores estrangeiros impõem indiretamente aos exportadores. Por exemplo, o Japão tem cerca de 77% da sua pegada fora das fronteiras do país.
Atualmente a mensuração da “pegada hídrica”, tem utilizado protocolos não padronizados e baseados em pressupostos distintos – conversão alimentar, composição nutricional, clima, sistema de produção, unidade geográfica, etc, cujos resultados revelam amplo desvio analítico e razoável insignificância.
Essa insegurança estatística incentivou sobremaneira a elaboração da ISO 14046 que estabelecerá protocolo único para harmonização das métricas exigidas nos cálculos confiáveis de precisão e comparação. Ademais, a respectiva referência internacional servirá de complemento à ISO 14064/2006 voltada à quantificação, monitoramento e mitigação dos gases de efeito-estufa e a ISO/TC 207 utilizada na avaliação do ciclo de vida dos produtos.
É consenso que ainda na metade desse século a sociedade global pode vir a demandar quase 450 milhões de toneladas de carnes, ou seja, 200 milhões de toneladas oriundas das aves, aproximadamente 140 milhões de toneladas dos planteis suínos e algo em torno de 100 milhões de toneladas dos bovinos. O consumo de água para cada quilo de carne de aves produzido é de 4 mil litros, quase 6 mil litros para cada quilo de carne suína e mais de 15 mil litros de água para o quilo de carne bovina.
A quase totalidade, cerca de 93% da água usada nessas cadeias produtivas serve às safras de cereais e oleaginosas utilizadas na alimentação desses animais, enquanto 4% é consumida para saciar a sede e 3% aplicada na limpeza e resfriamento de equipamentos e instalações.
A explosão demográfica que pode elevar a população global ao patamar de 9,5 bilhões até a metade desse século estima concentrar 90% desses novos habitantes na Ásia e na África. O apetite crescente desses emergentes por produtos agropecuários poderá ser saciado pelos saltos de renda apurados até 2050, com a elevação do Produto Interno Bruto da China para U$ 48 trilhões e o da Índia para U$ 27 trilhões. No caso dos países pós-desenvolvidos, a previsão é que o PIB americano triplique alcançando U$ 38 trilhões e o Japonês atinja os U$ 8 trilhões.
Essas elevações da renda per capita e consumo certamente serão acompanhadas do aumento na emissão de carbono na atmosfera, além de maior consumo de água. O alerta aponta para a urgência na preservação dos recursos e do volume total de água usada direta (manufatura) ou indiretamente (embutida nos insumos) na elaboração de um produto.
No último dia 22 de Março comemoramos o dia mundial da água e no próximo mês de Junho nosso país sediará a Rio+20, Conferência das Nações Unidas para o desenvolvimento sustentável, oportunidade singular para reflexão sensata e despojada dos delírios de grandeza dos mais ricos.
Os eventos paralelos organizados simultaneamente às rodadas oficiais certamente servirão de incentivo para que autoridades e negociadores globais despertem para a necessidade da inevitável modificação do padrão de consumo dos mais ricos, porque a contenção da demanda dos menos afortunados é flagrantemente inoportuna e acima de tudo injusta.
Veja o PDF da matéria:
Por Ariovaldo Zani
Fonte: Revista Feed & Food – Edição Abril 2012